sábado, 6 de junho de 2009

Um Poema Irreverente

Meu irreverente lado parnasiano
insiste em rimar o nada com piano!
Tudo tinha qu’estar sempre na forma,
pois ao amor o sentido deforma.

Mas meu coração romântico
canta um movimento só:
um harmônico semântico,
qu’explode as notas em dó e

qu’inspira a poesia d’amor,
pois os versos qu’amam são
tal doce composição.

Se a paixão vem'em redondilha maior,
os decassílabos servem então
par'o coração sentir-se melhor!

Momento

No amor não são relevantes
Os pronomes interrogativos: onde? e como?
O importante é o agora

Mulher

Toda mulher é uma poesia

Não escrita e não recitada

Apenas moldada em carne fina,

Alguns têm a graça de desvendar-lhes

O mistério

De serem todas em apenas uma

Paixão

São pensamentos fúteis
A chuva encharcou as lágrimas
Que caíram sobre o cobertor

Homens

Somos os abutres
Que se alimentam
Das vísceras do mundo...

Poetas

O inferno vai ter que esperar
Os poetas não morrem
Vivem enterrados nas estantes

Passageiros da Vida - Felipe Anicet e Alexandre Djorkaeff

Era uma fria noite de inverno e eu estava voltando para casa. Tinha tido um dia corrido. Apesar de amar o que faço, estou receoso com meu futuro. Não sei se o que ganho como professor condiz com o esforço que fiz para chegar até aqui. Leciono desde muito jovem, uma vez que tinha que ajudar financeiramente lá em casa. Vai ver é por isso que não tive tempo para me qualificar o quanto sempre desejei.

Meu carro estava estragado, então andava com o do meu irmão. Todo cuidado era pouco, pois não parava de chover. Quando cheguei à avenida principal, deparei-me com um engarrafamento gigantesco e já comecei a me estressar. O tempo não passava. Não agüentava mais esperar, quando lembrei, então, que haveria um jantar com a família da minha mulher; era o aniversário do meu cunhado. Só de pensar em todos reunidos lá em casa já me dava mais dor de cabeça.

De repente, sinto uma batida atrás do carro. Não poderia ser verdade! Uma daquelas camionetes SUV tinha dado uma encostada em mim, o suficiente para dar aquela amassada. Pronto, o mundo tinha definitivamente acabado! Meu irmão iria me matar! Eu fiquei enfurecido e todos os xingamentos possíveis vieram à cabeça.

Olhei para trás tentando encontrar o culpado pela minha, já certa, morte espiritual e financeira. Apesar da forte chuva e de já estar escuro, o que vi foram alguns homens querendo falar com o motorista do carrão. Fiquei mais calmo então, vai ver era a polícia ou os fiscais de trânsito que resolveram agir rápidos, contudo, algo estranho aconteceu: um dos homens, o maior deles e que usava farda da polícia, tirou uma pistola e apontou para o motorista da SUV. Bateu aquele frio na barriga. Claro! Como não tinha percebido antes: eram assaltantes e eu me tornara a testemunha ocular. Que grande merda essa em que eu me meti! Pensei, então, no que poderia fazer, mas me senti impotente. Entre o dono da SUV e eu, que seja ele, pelo menos tinha mais dinheiro e deveria ter seguro contra roubo. Vendo a relutância daquele motorista em entregar os bens, comecei a sentir pena do, agora, apenas, dono do carro detrás.

Estava muito nervoso. Para mim, não existia mais jantar e muito menos dor de cabeça. Fiquei imaginando o que passava na cabeça do proprietário do carrão. Certamente ele estaria mais preocupado do que eu. Seria dele mesmo o carro? Meu Deus! E se ele também tivesse pegado emprestado do irmão, ou do patrão, ou...? E se os assaltantes levassem o carro com o motorista junto, o que aconteceria? Bom, azar dele, pois ninguém mandou desfilar na rua de carrão, muito menos mandou bater na traseira do meu. Droga, que pensamento esse meu, eu não sou tão mesquinho assim. Acho que se não o seqüestrarem, eu até dou uma carona pra ele.

Não sabia quanto tempo já havia passado. Poderia ter sido uma hora ou apenas dez minutos, ou os dois, quem sabe... Não importava agora. Então ouvi três – não! – quatro tiros. Um silêncio mortal invadiu o ambiente. Ninguém se mexia e só era possível ouvir o som da chuva. Ele estaria morto? Ele estava mesmo morto! Meu Deus, que horror, será que agora eles virão até mim? Matar também a testemunha do crime? Não...

Os bandidos fugiram rapidamente. Fiquei pálido e não quis ir embora, logo a ambulância chegou, alguém deve ter ligado para a emergência; tiraram da SUV a vítima, um rapaz de uns vinte e cinco ou trinta anos, todo ensangüentado. Acho que o disparo acertou o pescoço, da onde estava não tinha uma visão tão privilegiada assim. Dei meu depoimento. Pelo menos teria uma desculpa para não ficar com os familiares insuportáveis de minha esposa. Nunca mais soube notícias do evento ou dos bandidos, nem sequer achei alguma nota nos jornais a respeito.

Antes de regressar para casa, ainda olhei a chuva que caía. Surtei daquela realidade. O que realmente faz sentido para mim? O que realmente importa nessa vida? Voltei a mim e condenei minha impotência e mesquinhez. Fiquei imaginando se tivesse sido comigo, como ficariam meus familiares e amigos?!. Percebi, finalmente, o real valor da cena que acabará de presenciar. Não sei se aquele rapaz tinha família, mas se tivesse, esse seria, com certeza, um dos momentos mais difíceis e dolorosos que os familiares teriam que passar. Decidi ir para casa logo, necessitava do aconchego da minha esposa e dos meus filhos. A tomar pelo horário, já estariam todos lá em casa festejando o aniversário de meu cunhado. Então, bati a chave do carro e fui para casa, antes, porém, dei uma breve passada no shopping para lhe comprar um presente, lógico que algo barato. Afinal, a vida não está fácil...