A modernidade tecnológica trouxe facilidades no campo das comunicações para todos nós. A cada segundo, somos bombardeados com informes, notícias, informações que podem ou não serem úteis num dado momento, porém os dados são tantos e tão variados que nossa capacidade de assimilação procura filtrar aquilo que nos interessa, e na maioria das vezes, de forma imediata, o que nos torna um tanto indolentes à prática de leituras clássicas e sadias.
Se para nós adultos, maduros e responsáveis é complicado nos dedicarmos a uma leitura clássica, devido à grande variedade de temas para ler, a uma rotina desgastante e a compromissos fatídicos que assumimos diariamente, além do acesso a uma grande quantidade de “informações” objetivas e simplificadas que nos tornam indolentes à prática de uma leitura densa e compromissada, como vê a leitura o nosso jovem, filho, aluno, já acostumado a esse processo frenético, desenfreado e midiático de receber informações?
O imediatismo do pensamento acelerado já tomou conta dos nossos alunos, das nossas casas, das nossas rotinas e se bobear até das nossas refeições, cada vez mais ricas em fast-foods. Perdoem-me a comparação, mas gosto sempre de equiparar a alimentação com a leitura, pois se somos o produto do que ingerimos por via oral, também o somos por via intelectual. Apreciar uma boa alimentação é tão importante ao corpo como apreciar uma boa leitura, uma vez que a nutrição sadia eleva as condições de funcionamento do corpo, um bom livro aumenta a capacidade de percepção, criação, raciocínio, intelecto, além de auxiliar na formação da identidade do indivíduo. Entretanto, da mesma forma em que, para se saborear uma boa comida, ela deve estar bem preparada, para se ler um bom livro clássico, o leitor também deve ser preparado para poder entendê-lo e apreciá-lo.
Contudo, o processo de leitura, ou o ensino do processo de leitura, não é algo fácil. É comum, o aluno ter a resistência inicial ao clássico literário; comentários como “lá vem aquele livro chato de novo!”, “prof, a gente não podia ler o livro da Bruna Surfistinha ou uma coisa do tipo?” são comuns. Isso acontece, dentre tantos motivos, também a uma carência de informações, já que os informes (pseudo-informações; nunca estão processadas, normalmente de cunho enfático e bombástico, utilizados pelos meios de comunicação de massas) não dão conta da totalidade que o jovem necessita e, ainda o tornam resistentes, pois ao tratar do assunto, o aluno se crê sabedor de tudo, e parar para desenvolver o tal assunto é, para ele, perder tempo. Instigar, provocar, questionar, normalmente, são boas saídas para quebrar essa barreira inicial imposta pelo jovem.
Após quebrar o muro de Berlim imposto pelo aluno ao livro clássico, surge outro problema: a leitura como obrigação e avaliação. Voltando ao nosso processo culinário, o jovem vê a leitura solicitada pelo professor como uma rúcula, uma alface ou um agrião. Ele sabe que esses vegetais fazem bem, mas se pudessem não comê-los seria bem melhor, afinal, nenhum deles tem gosto de chocolate e nunca vão ter, todavia um bom chef pode desenvolver um prato apetitoso em que esses ingredientes apareçam em certa quantidade, suficiente, para serem bem apreciados. O mesmo vale para a leitura, o professor, assim como os pais, devem propor eventos de letramento para os jovens, e isso não é tão difícil quanto parece. Basta comentar de maneira enfática sobre um dado livro tendo em vista o interesse do adolescente em questão, que ele já vai ficar interessado na obra, a contação de histórias é um outro excelente caminho, bem como estabelecer uma discussão sobre um tema que é proposto num livro em especial.
Assim, tornar a leitura obrigatória em um prazer é um processo que pode ser desencadeado por qualquer pessoa, pois somos curiosos por natureza. Se gosto de contos de fadas, por que não ler O Fantástico Mistério de Feiurinha, em que Pedro Bandeira trabalha com a desconstrução dos contos de fadas e propõe uma história interessante e moderna. Se gosto de contos, por que não ler os contos de Lygia Fagundes Telles, particularmente adoro Antes do Baile Verde, que reflete bem a questão das responsabilidades e como os jovens a encaram, e Venha Ver o Pôr-do-Sol, que possui um suspense que nos consome do início ao fim e nos aterroriza naquele “grito medonho, inumano: NÃO”. Se a poesia é o que me interessa, por que não ler os poemas concretistas dos irmãos Campos, ou os poemas de Fernando Pessoa que nos deixam perplexos e questionando tudo e todos, ou a poesia de Bocage. É claro que para isso, eu tenho que preparar o meu aluno, deixá-lo com a pulga atrás da orelha, apresentar para ele que muitos dos interesses que ele tem, estão ali esperando por ele, assim como mostrar para ele que ler um clássico não é como ler um Código da Vinci, pois o clássico exige a reflexão, e como diz Calvino: “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer (...) que chegam até nós trazendo consigo marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram”.
Quando a leitura passa a ser um prazer, ela se torna uma prática, e através dela se busca os temas e o que mais se deseja conhecer. E, mais uma vez voltando a nossa gastronomia, se temos o prazer de comer um cheese extremamente gorduroso e repleto de maionese, e o faço diariamente, meu corpo irá sentir os prejuízos disso numa possível intoxicação alimentar. Da mesma forma, se estou habituado a ler revistas de baixo teor informativo, livros de baixa qualidade literária (e de maneira alguma considero de baixo teor literário as subliteraturas dos Harry Potters, crônicas vampirescas de Anne Rice, os suspenses de Stephen King, Sidnei Sheldon ou Agatha Christie), as leituras superficiais e objetivas que propõem soluções mágicas e não instigam o processo reflexivo, mas a acomodação do pensamento, também estou sujeito a uma intoxicação intelectual.
Assim, a prática da intoxicação intelectual leva o jovem a se entregar horas a fio em frente ao computador para jogar joguinhos viciantes e, muitas vezes, violentos, perder a noção do tempo no orkut, chats, entre outros. Aí, quando o adolescente retorna ao ambiente, lembra do trabalho que tinha para fazer. Barbada! (pensa ele) basta copiar e colar, imprimir e pronto! Sequer leu o que imprimiu, sequer teve contato com aquele conteúdo intelectual que não lhe pertence, mas entrega ao professor como se lhe pertencesse. Afinal, para que ler, isso é tão chato, tem coisa melhor para fazer.
Por fim, entendo que a leitura é uma prática, é um processo, gostamos daquilo que entendemos, àquilo que somos realmente expostos e que nos faz sentido, do que nos é palpável, reconhecido e ao mesmo tempo diferente. Logo, a leitura é o alimento do intelecto e da alma. Dessa maneira, se apenas conheço a comida para intelecto fast-food, ela sempre será para mim a melhor. Agora, se for exposto a outras experiências intelecto-gastronômicas, talvez num primeiro momento estranhe, mas na medida que for apreciando essa culinária, não apenas para deixar o estômago satisfeito, mas para deliciar uma iguaria do saber, para aprender sobre uma cultura, para ter bons hábitos e para, simplesmente, nutrir o corpo e a mente, então realmente terei aprendido a ler, e a ler com sabedoria.
Se para nós adultos, maduros e responsáveis é complicado nos dedicarmos a uma leitura clássica, devido à grande variedade de temas para ler, a uma rotina desgastante e a compromissos fatídicos que assumimos diariamente, além do acesso a uma grande quantidade de “informações” objetivas e simplificadas que nos tornam indolentes à prática de uma leitura densa e compromissada, como vê a leitura o nosso jovem, filho, aluno, já acostumado a esse processo frenético, desenfreado e midiático de receber informações?
O imediatismo do pensamento acelerado já tomou conta dos nossos alunos, das nossas casas, das nossas rotinas e se bobear até das nossas refeições, cada vez mais ricas em fast-foods. Perdoem-me a comparação, mas gosto sempre de equiparar a alimentação com a leitura, pois se somos o produto do que ingerimos por via oral, também o somos por via intelectual. Apreciar uma boa alimentação é tão importante ao corpo como apreciar uma boa leitura, uma vez que a nutrição sadia eleva as condições de funcionamento do corpo, um bom livro aumenta a capacidade de percepção, criação, raciocínio, intelecto, além de auxiliar na formação da identidade do indivíduo. Entretanto, da mesma forma em que, para se saborear uma boa comida, ela deve estar bem preparada, para se ler um bom livro clássico, o leitor também deve ser preparado para poder entendê-lo e apreciá-lo.
Contudo, o processo de leitura, ou o ensino do processo de leitura, não é algo fácil. É comum, o aluno ter a resistência inicial ao clássico literário; comentários como “lá vem aquele livro chato de novo!”, “prof, a gente não podia ler o livro da Bruna Surfistinha ou uma coisa do tipo?” são comuns. Isso acontece, dentre tantos motivos, também a uma carência de informações, já que os informes (pseudo-informações; nunca estão processadas, normalmente de cunho enfático e bombástico, utilizados pelos meios de comunicação de massas) não dão conta da totalidade que o jovem necessita e, ainda o tornam resistentes, pois ao tratar do assunto, o aluno se crê sabedor de tudo, e parar para desenvolver o tal assunto é, para ele, perder tempo. Instigar, provocar, questionar, normalmente, são boas saídas para quebrar essa barreira inicial imposta pelo jovem.
Após quebrar o muro de Berlim imposto pelo aluno ao livro clássico, surge outro problema: a leitura como obrigação e avaliação. Voltando ao nosso processo culinário, o jovem vê a leitura solicitada pelo professor como uma rúcula, uma alface ou um agrião. Ele sabe que esses vegetais fazem bem, mas se pudessem não comê-los seria bem melhor, afinal, nenhum deles tem gosto de chocolate e nunca vão ter, todavia um bom chef pode desenvolver um prato apetitoso em que esses ingredientes apareçam em certa quantidade, suficiente, para serem bem apreciados. O mesmo vale para a leitura, o professor, assim como os pais, devem propor eventos de letramento para os jovens, e isso não é tão difícil quanto parece. Basta comentar de maneira enfática sobre um dado livro tendo em vista o interesse do adolescente em questão, que ele já vai ficar interessado na obra, a contação de histórias é um outro excelente caminho, bem como estabelecer uma discussão sobre um tema que é proposto num livro em especial.
Assim, tornar a leitura obrigatória em um prazer é um processo que pode ser desencadeado por qualquer pessoa, pois somos curiosos por natureza. Se gosto de contos de fadas, por que não ler O Fantástico Mistério de Feiurinha, em que Pedro Bandeira trabalha com a desconstrução dos contos de fadas e propõe uma história interessante e moderna. Se gosto de contos, por que não ler os contos de Lygia Fagundes Telles, particularmente adoro Antes do Baile Verde, que reflete bem a questão das responsabilidades e como os jovens a encaram, e Venha Ver o Pôr-do-Sol, que possui um suspense que nos consome do início ao fim e nos aterroriza naquele “grito medonho, inumano: NÃO”. Se a poesia é o que me interessa, por que não ler os poemas concretistas dos irmãos Campos, ou os poemas de Fernando Pessoa que nos deixam perplexos e questionando tudo e todos, ou a poesia de Bocage. É claro que para isso, eu tenho que preparar o meu aluno, deixá-lo com a pulga atrás da orelha, apresentar para ele que muitos dos interesses que ele tem, estão ali esperando por ele, assim como mostrar para ele que ler um clássico não é como ler um Código da Vinci, pois o clássico exige a reflexão, e como diz Calvino: “um clássico é um livro que nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer (...) que chegam até nós trazendo consigo marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram”.
Quando a leitura passa a ser um prazer, ela se torna uma prática, e através dela se busca os temas e o que mais se deseja conhecer. E, mais uma vez voltando a nossa gastronomia, se temos o prazer de comer um cheese extremamente gorduroso e repleto de maionese, e o faço diariamente, meu corpo irá sentir os prejuízos disso numa possível intoxicação alimentar. Da mesma forma, se estou habituado a ler revistas de baixo teor informativo, livros de baixa qualidade literária (e de maneira alguma considero de baixo teor literário as subliteraturas dos Harry Potters, crônicas vampirescas de Anne Rice, os suspenses de Stephen King, Sidnei Sheldon ou Agatha Christie), as leituras superficiais e objetivas que propõem soluções mágicas e não instigam o processo reflexivo, mas a acomodação do pensamento, também estou sujeito a uma intoxicação intelectual.
Assim, a prática da intoxicação intelectual leva o jovem a se entregar horas a fio em frente ao computador para jogar joguinhos viciantes e, muitas vezes, violentos, perder a noção do tempo no orkut, chats, entre outros. Aí, quando o adolescente retorna ao ambiente, lembra do trabalho que tinha para fazer. Barbada! (pensa ele) basta copiar e colar, imprimir e pronto! Sequer leu o que imprimiu, sequer teve contato com aquele conteúdo intelectual que não lhe pertence, mas entrega ao professor como se lhe pertencesse. Afinal, para que ler, isso é tão chato, tem coisa melhor para fazer.
Por fim, entendo que a leitura é uma prática, é um processo, gostamos daquilo que entendemos, àquilo que somos realmente expostos e que nos faz sentido, do que nos é palpável, reconhecido e ao mesmo tempo diferente. Logo, a leitura é o alimento do intelecto e da alma. Dessa maneira, se apenas conheço a comida para intelecto fast-food, ela sempre será para mim a melhor. Agora, se for exposto a outras experiências intelecto-gastronômicas, talvez num primeiro momento estranhe, mas na medida que for apreciando essa culinária, não apenas para deixar o estômago satisfeito, mas para deliciar uma iguaria do saber, para aprender sobre uma cultura, para ter bons hábitos e para, simplesmente, nutrir o corpo e a mente, então realmente terei aprendido a ler, e a ler com sabedoria.
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